VATILEAKS: A CONSPIRAÇÃO PARA MATAR O PAPA NESTE APOCALÍPTICO 2012

Ratzinger fazendo a saudação nazi enquanto jovem, durante uma missa

Já há quem chame Vatileaks ao novo desaire do Vaticano. Nas últimas semanas têm chegado à imprensa italiana supostos documentos confidenciais da cúria romana que dão conta da existência de conspirações nos corredores da Santa Sé. Um deles aponta mesmo para um estranho complô com o objectivo de assassinar o Papa Bento XVI e o próprio jornal do Vaticano, “L’Osservatore Romano”, já escreveu que o Papa, prestes a completar 85 anos, se transformou num “pastor cercado por lobos”. O primeiro golpe – como lhe chama o porta-voz da Santa Sé, Federico Lombardi – chegou através do jornal “Il Fatto Quotidiano”, que divulgou uma carta do cardeal colombiano Darío Hoyos endereçada ao Papa. Na missiva, escrita em alemão e enviada para o Vaticano a 31 de Dezembro com o selo de “estritamente confidencial”, o cardeal avisa Bento XVI de que uma conspiração estaria a ganhar forma dentro da cúria. Darío conta que, durante uma viagem à China, em Novembro do ano passado, o arcebispo siciliano de Palermo, Paolo Romeo, terá garantido que o Papa morreria “nos próximos 12 meses”. A intriga estender-se-ia também ao número dois da Santa Sé, o secretário de Estado Tarcisio Bertone.

Na carta, o colombiano alerta para “o grave perigo que corre o santo padre” e conta que o objectivo da conspiração será fazer chegar o actual arcebispo de Milão, o cardeal Angelo Scola, ao topo da Igreja. A carta está dividida em três partes. Na primeira, intitulada “Viagem a Pequim”, Darío fala no à-vontade com que o arcebispo terá contado detalhes da suposta conspiração. A segunda, com o título “O secretário de Estado Tarcisio Bertone”, faz alusão aos confrontos frequentes entre o Papa e o seu número dois – que, garante a imprensa italiana, tem arranjado diversos inimigos nos últimos seis anos. Na última parte, “A sucessão do Papa Bento XVI”, Darío revela que Scola deverá ser o novo líder da Igreja. O porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, já veio a público desvalorizar o assunto, afirmando que se “trata de divagações que não devem, de modo algum, ser levadas a sério”. Certo é que o arcebispo de Palermo já tem antecedentes: em 2006 tentou a nomeação para presidente da Conferência Episcopal Italiana, promovendo mesmo uma consulta junto de todos os bispos para ser eleito. Mas no final acabaria por ser desautorizado publicamente por Bento XVI.

Dias antes da polémica carta, o canal de televisão italiano “La 7” divulgava uma outra, alegadamente escrita pelo arcebispo Carlo Viganó, actual núncio apostólico dos Estados Unidos. No documento, igualmente endereçado ao Papa, Viganó, que é também o responsável pelo Governatore da Santa Sé, denunciava casos de alegada “corrupção” dentro do Vaticano e chegava a pedir a demissão do cargo. Tanto quanto se sabe, Bento XVI não lhe terá respondido. O Vaticano já reagiu à divulgação dos documentos para dizer que existe um caso Vatileaks, com o intuito de descredibilizar a Igreja. Num comunicado lido na Rádio Vaticano, Lombardi, porta-voz da Santa Sé, pediu “calma e sangue frio”. “O governo americano teve o Wikileaks e o Vaticano tem agora a sua Vatileaks, as suas fugas de documentos, que pretendem gerar confusão e dar uma má imagem do Vaticano e do governo da Igreja”, acrescentou. Lombardi aproveitou o tempo de antena para avisar “aqueles que acreditam conseguir abalar a Igreja com intrigas” de que estão “muito enganados” e lembrou ainda que é “muito natural” que existam “posições diferentes e diversificadas” dentro do governo da Igreja. os Lobos de púrpura Depois do consistório deste fim-de-semana, em que foram proclamados 22 novos cardeais, o Vaticano tem a pesada tarefa de limpar as consequências de um novo escândalo junto da opinião pública.

O alegado complô para assassinar Bento XVI vem pôr a descoberto as lutas de poder dentro da cúria romana – onde muitos parecem ansiosos pelo fim do papado de Bento XVI, debilitado e prestes a fazer 85 anos. As motivações dos “lobos vestidos de púrpura” para fazer cair o Papa são as mais diversas: desde 1978 que o maior lugar da Igreja não é ocupado por um italiano e alguns cardeais entendem que chegou a hora de isso acontecer; outros consideram que Ratzinger foi longe de mais ao tentar promover a transparência dos dinheiros da Igreja (ver texto ao lado) e cortar na permissividade em relação aos abusos sexuais de menores entre o clero. Demasiadas ambições para um octogenário introvertido, doente e cada vez mais sozinho, tendo em conta os confrontos com o seu número dois. A jogar contra o actual Papa está ainda ser muito diferente do seu antecessor, João Paulo II, o Papa polaco que durante 26 anos foi muito hábil em matéria de diplomacia e relações públicas dentro da Igreja. Conta-se que o anterior Papa, João Paulo II, foi uma vez questionado sobre quantas pessoas trabalhavam no Vaticano. “Mais ou menos metade”, respondeu ironicamente. Já Ratzinger tem sido visto como uma figura introvertida e obstinada.

Há dois anos, Bento XVI dizia, numa entrevista ao seu jornalista favorito, o alemão Peter Seewald, que quando um Papa “tem a clara consciência de que não está bem física e espiritualmente para levar adiante a função que lhe foi confiada, tem o direito e, em algumas circunstâncias, o dever de se demitir”. Por isso também já há quem especule, em Roma, que Bento XVI pensa demitir-se em Abril – mês em que completa 85 anos de vida e sete de pontificado. Por enquanto, a secretaria de Estado do Vaticano está empenhada em descobrir os autores das alegadas fugas de informação. Mas para alguns jornalistas vaticanistas é certo que os responsáveis fazem parte de uma ala obscura do Vaticano que não estará particularmente interessada em que se faça uma limpeza às contas do banco da Santa Sé – algo em que o Papa Bento XVI parece estar fortemente empenhado nos últimos tempos. As fugas de informação referentes a este caso referem ainda as ligações do banco do Vaticano, o Instituto de Obras Religiosas (IOR), ao fecho do Banco Ambrosiano, há cerca de 30 anos. O IOR já garantiu que se vai adaptar às regras da União Europeia sobre transparência financeira até Junho. (in, Jornal i)